Mãe até debaixo d’água... e dentro do cinema
Eles aprendem rápido.
Minha filha, por exemplo, sacou logo que tem duas mãos, dois braços, dois pés,
duas pernas, dois olhos, um nariz, uma boca e uma mãe, caso qualquer coisa falhe.
Nos primeiros meses de vida, a mãe e o bebê funcionam como uma pessoa só,
principalmente se a amamentação é natural. A dependência é extrema e o bebê
passa o tempo todo solicitando atenção materna. A vida da mãe, portanto, fica
reduzida ao mais básico das necessidades básicas. Banhos só de vez em quando e
muito rápidos, xixi da manhã só no fim do dia, refeições são ocorrências eventuais
com algo que se possa buscar na cozinha e não exija preparo de nenhuma espécie,
maquiagem, perfume e hidratante nem pensar, depilação, manicure, cabeleireiro só
se for com o bebê no colo e vida social... Ãhn?
Foi pensando nisso que um grupo de mães com saudades da vida cultural criou
a Associação CineMaterna que, sem fins lucrativos, organiza sessões especiais de
cinema por todo o Brasil, para acolher mães com seus bebês de até 18 meses. A
temática dos filmes exibidos é bastante variada*, indo de desenhos até conteúdos
adultos que podem entreter mamães e papais. Mas, invariavelmente, a sala é
preparada para receber as crianças. O som da exibição é mais baixo, ar
condicionado suave, luzes tênues acesas, trocador equipado disponível (com fraldas
e produtos de higiene), tapete colorido para crianças que engatinham e uma equipe
feminina muito atenta e gentil, auxiliando com a acomodação e o transporte de
acessórios (cadeirinhas, malas, objetos pessoais).
A ideia é não somente viabilizar a experiência do cinema às mães com crianças
pequenas, como também promover encontros para dialogar sobre os prazeres e
dilemas da maternidade. As participantes são sempre convidadas para um bate-
papo que acontece após a sessão, em um local próximo à sala de exibição do filme,
algumas vezes com a presença de profissionais da área da saúde feminina ou
pediátrica e a divulgação de eventos como a Hora do Mamaço. O projeto começou
em 2008 e já está em 34 cidades, disponibilizando 68 salas de cinema pelo País.
Quando fui pela primeira vez, esperava encontrar uma sessão quase vazia, com
meia dúzia de mães com seus bebezinhos de peito quietinhos e sonolentos. Que
nada! A sala enche, a procura é grande e a sinfonia é geral. Choro, tosse, gritinhos,
cantoria repetitiva. O bom é que rola um clima de solidariedade coletiva, uma
irmandade maternal. Um minuto é o filho da outra. No minuto seguinte é o seu. E
vale tudo: dar de mamar, ficar de pé e circular pelas laterais ou fundos da sala,
colocar para engatinhar e interagir com outras crianças, trocar a fraldinha suja,
deixar viver. Mas não muito! Vi mãe desesperada correr atrás do bebê perdido, que
foi engatinhando entre as poltronas até ficar fora de alcance. Daí a idade limite de
18 meses. Quanto mais esperto for o pequenino, maior a vontade de se movimentar
e explorar o ambiente, mais impaciente fica e mais difícil para a mamãe conseguir
controlar o ímpeto infantil. Fica, portanto, quase impossível prestar atenção ao
filme.
A ideia e o trabalho da equipe são excelentes. Em algumas exibições é oferecida
entrada gratuita para as primeiras 20 pessoas ou é possível conseguir ingressos com
voucher distribuídos em ambientes de circulação de mamães. Há sempre uma
fotógrafa de plantão para registrar as sessões e os produtos disponíveis são de
marcas conhecidas. O inconveniente é que, eventualmente, alguém pode,
discretamente, colocar um produto pertinho, para que saia na foto em primeiro
plano enquanto você troca a fralda do seu bebê desavisadamente. No meu caso, não
liguei, porque a marca é a que eu uso mesmo. Mas, caso não concorde com a
exploração da imagem pelos patrocinadores, acredito que não haja problemas em
negar a exposição.
Confira a programação no site e boa sessão!
Serviço
* Filmes de terror e violência explícita ficam de fora da programação
Clique aqui para conferir a agenda do CineMaterna.
Camila Caringe
Muito mãe, bastante jornalista e consideravelmente afeita a queijo gouda, na respectiva ordem de importância.
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