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Sobre Doenças Psicológicas e Ser Mulher

Texto/depoimento: Gabriela Santos, 23 anos

De repente meu mundo despencou e eu não soube agir.

De repente tudo me irritava, tudo era sofrimento, tudo era dor.

Eu não conseguia me lembrar das coisas que me faziam sentir prazer, não conseguia me lembrar quem eu era. Parecia que alguns anos da minha vida se passaram sem a minha presença. Tinha um buraco na minha história.

Não conseguia me ver no espelho, aliás, evitava espelhos.

Não arrumava a cama, o cabelo, a roupa. Apenas passava noites em claro, levantava com muito, muito esforço, vestia qualquer roupa e ia trabalhar. Na verdade eu não ia trabalhar, eu ia cumprir meu horário de trabalho.

Todas essas coisas sucumbiram em uma crise terrível de ansiedade . Não vou entrar em detalhes sobre o transtorno de ansiedade nesse texto, mas foi meu diagnostico depois de muitas idas à hospitais, exames, desmaios e a certeza de que eu estava morrendo. Em partes essa sensação de estar morrendo é verdadeiro. Não que eu estivesse morrendo, mas eu me dei conta de que estava deixando de viver.

Nunca achei que tivesse sintomas de depressão! Sempre achei que todo mundo se achava um lixo, que aquele vazio que sentia (sinto) era algo natural do ser humano.

Acontece que esses sentimentos se tornaram insuportáveis e tiveram dias em que eu achei que fosse mesmo morrer e que isso até fosse bom, porque parecia a única maneira de me livrar de toda aquela dor e aquele peso que eu carregava sem ser eu.

Bom, partindo daí, eu tinha duas opções:

1 - Morrer

2 – Viver

Escolhi viver. Aliás, escolho viver todos os dias que acordo com uma imensa vontade de não sair da cama e ver a vida passar novamente sem mim, mas luto contra esses pensamentos, me levanto e dou valor àquele dia.

Logo que me dei conta do meu problema, comecei a procurar respostas em tudo o que eu pudesse: livros, internet, revistas e me deparei com pessoas que descreviam o que eu sentia e que também estavam procurando respostas, que davam dicas de como conseguiram algum tipo de melhora, mas que não estavam salvas.

Passei pela fase dos medicamentos, faço terapia e dei início ao tratamento com florais, mas eu NÃO ESTOU SALVA.

Há um ano tive que aprender a lidar comigo mesma da maneira mais violenta e brutal que consigo imaginar. O ano de 2015 foi terrível pra mim. Mas agora sou grata. Sou grata pelas crises que me fizeram enxergar que eu estava indo pelo caminho totalmente oposto ao que era meu! Muito provavelmente, se não fosse a primeira crise “mais grave”, eu teria continuado vivendo na inércia, como cá entre nós, muita gente faz, muita mesmo!

Mas o que eu percebi com isso tudo além do meu umbigo?

Percebi que praticamente todas as mulheres estão fadadas a desenvolverem algum transtorno psicológico.

Sinto e vejo que o mundo está mudando, apesar de ainda ter muita pra evoluir em todos os sentidos. Mas a sociedade desde sempre reprime, demoniza e padroniza a mulher.

Logo que nascemos, muitas de nós já sofremos violência e desrespeito, ao furarem nossas orelhas e enfiarem brincos pra afirmarem dessa maneira nossa feminilidade. Isso é violência SIM! Alguém sabia se eu ia querer usar brincos?

Aí vem a infância, fase onde podemos ser livres, sem medo do futuro e espontâneas, certo? Errado! É na infância que somos ensinadas que nosso mundo é restrito, que nossa cor é rosa, que nossa roupa é vestido, que se for subir numa árvore, tem que tomar cuidado com a roupa, por que somos “mocinhas”.

É ainda na infância, geralmente na escola, que sofremos as primeiras consequências do machismo reproduzido por meninos, CRIANÇAS, que foram ensinados que podem e devem olhar pra uma menina de 7, 8 anos como se ela não fosse digna do meu respeito com que trata seus amigos do sexo masculino. Isso é generalizar? Não sei. Tive muitos amigos que não agiam dessa forma comigo, mas que em algum momento me faziam sentir menor do que eu era, apenas por ser mulher, as vezes até de maneira inconsciente. Não acho que uma criança QUEIRA isso, ela está reproduzindo o que foi ensinado à ela.

Fora a disputa entre mulheres, desde meninas, encorajada pela sociedade nossa “criação”. Meninas menosprezando outras porque pegam o carinha X ou vestem roupas melhores, ou tem melhores condições financeiras, ou vão ao shopping todo final de semana, ou porque tem muitos “amigos” e pessoas que as seguem.

A adolescência é um capítulo à parte na vida de uma mulher.

É onde qualquer decisão sua será criticada, sem exceções! Se você se mostra ser bem resolvida, se relacionar com quem quiser: vadia!

Se fica na sua, se isola, porque todas as coisas que passou até então fizeram você achar que se isolar e ver a vida como espectadora era a maneira mais confortável: sem personalidade, casta, se faz de santa, sem graça, doente, depressiva, esquisita.

Fora a classificação: “essa não serve pra namorar”, “não falo sobre minha vida com a minha namorada, mas falo sobre como comi uma vadia no banheiro da balada com muito orgulho” (inclusive muitas vezes as expõe). Não vejo nenhuma lógica em falas como essas.

Também é na adolescência que começam as comparações. O mundo inteiro te joga na cara que você precisa buscar a perfeição! Você precisa ter um corpo bonito, um cabelo bonito, ter atitude mas sabendo se dar ao respeito, você tem que ser uma namorada legal, caso tenha um relacionamento, enfim.

Nesse ponto podem acontecer duas coisas: você se entrega ao modelo de pessoa que as pessoas criaram pra você, ou você quer ir contra isso com todas as suas forças.

Comigo aconteceu a segunda. Todas as coisas que eu precisava decidir, pensava “não, se eu fizer isso, vão falar que é coisa de mulherzinha, preciso ser forte e mostrar isso”. Carreguei esse fardo até meus 23 anos, praticamente (sim, eu tenho 23 agora). Esse pensamento decidiu tudo por mim: minha profissão, minhas roupas, os lugares que eu frequentava, os amigos que eu escolhia ter, absolutamente tudo!

Acontece que cheguei à vida adulta e me dei conta de que todas nós fomos ou somos escravas de um sistema que oprime, que causa intriga, que nos faz sentir menos em todos os aspectos (a cultura pornô é um exemplo muito claro de que a ideia mundana é de que fomos feitas para satisfazer ao macho, afirmada pelo texto que diz que nascemos porque um MACHO nos cedeu sua costela).

Depois de todas essas reflexões, entendi o porquê de tantas mulheres “desenvolverem” depressão e outros problemas psicológicos. Esse mundo ainda é muito cruel com a gente. Pra se ter o mínimo de auto estima são muitos padrões pra desconstruir, muitos conceitos pra rever, muitos paradigmas a serem quebrados.

À você que passa por uma fase assim, só digo: NÃO DESISTA! Não devemos MESMO nos conformar com o mundo que criaram pra nós! É demorado, dolorido, causa transtornos em relacionamentos de qualquer nível, mas devemos criar nossa própria realidade, à nossa maneira, em vez de apenas nos permitir aquilo que foi dado à nós. A partir de hoje, me recuso acreditar que sou menos que alguém e que mereço punições do universo por não ter atingido a perfeição!

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